O leão infernal não deixa de andar em redor de nós durante toda a nossa vida, para nos devorar, e por isso S. Pedro diz que devemos nos armar contra os seus assaltos com o pensamento da paixão de Cristo: "Havendo Cristo padecido na carne, armai-vos também do mesmo pensamento (1 Pd.4,1). S. Tomás afirma que só a lembrança da paixão é um forte anteparo contra as tentações do inferno. E S. Ambrósio, ou outro santo, escreve: Se o Senhor conhecesse uma outra via para a salvação, melhor que a do sofrimento, ele no-la teria feito conhecer: indo, porém, à frente com a cruz às costas, nos demonstrou que não há meio mais próprio para nos procurar a salvação que o sofrer com a paciência e resignação e por isso quis ele mesmo dar-nos o exemplo na sua pessoa.
Diz S. Bernardo que nós, contemplando as grandes aflições do Crucificado, acharemos mais suportáveis as nossas. E em outro lugar: Que coisa te parecerá dura, se te recordares dos sofrimentos de teu Senhor? Tendo S. Delfina perguntado um dia ao seu marido S. Elzeário como podia suportar tantas injúrias com tão grande tranquilidade, respondeu-lhe este: Quando me vejo injuriado, penso nas injúrias que meu Salvador crucificado e não ponho de lado tal pensamento enquanto não me sinto apaziguado. A ignomínia da cruz é agradável àquele que não é ingrato ao Crucificado, diz S. Bernardo. Todas as almas que querem ser gratas a Jesus Cristo não detestam, mas se aprazem nos desprezos que recebem. Quem não receberá com prazer os opróbrios e os maus tratos, considerando somente os maus tratos que sofreu Jesus no começo de sua paixão, quando na casa de Caifás foi esbofeteado e pisado, e lhe escarraram no rosto, zombando dele como de um falso profeta, vendando os olhos com um pano, segundo o testemunho de S. Mateus? (Mt.26,27).
E como era possível os mártires sofrerem com tanta paciência os tormentos dos carnífices? Eram dilacerados com ferros, eram queimados nas grelhas: talvez não eram de carne ou perdiam os sentidos? não, mas eles não se punham a contemplar as suas feridas, mas as chagas do Redentor e assim pouco sentiam as próprias dores. Os tormentos não deixavam de os martirizar, mas eles os desprezavam por amor a Jesus Cristo. "Não há dor tão atroz que não seja suportável à vista de Jesus Crucificado.